segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Manicômios, conventos e prisões – Erwin Goffman

Não sou estudioso de ciência social alguma, apenas sou um leitor. Esse livro daí do título li em agosto, como parte de minha meta de leitura do ano. Pretendo ler vinte e quatro livros por ano, até o presente momento estou em dezoito. Escolho os danados pelo tema, esse é um deles. Os loucos, os presos e os religiosos. São todos parecidos de alguma forma, cada um dentro de uma gaiola diferente, a prisão mental, a prisão física, a prisão da alma. Erwing Goffman traz justamente a visão de um estudioso sobre as instituições, chamadas de totais, que mantêm esse povo todo trancafiado onde sociedades paralelas ao mundo se formam, existem e têm suas próprias regras.

Os manicômios tomam a maior parte do texto do livro, principalmente pelo fato do autor ter vivido, como estudioso com licença para observação, durante muitos anos dentro de um hospital psiquiátrico de grande porte. Muito legal os momentos onde ele explica como se organiza esse mundo paralelo. Os insanos se comportam parcialmente como nós, em busca de favores, maiores liberdades, amores, status dentro do meio em que vivem, claro, tudo isso com o viés da realidade como eles a enxergam. Os funcionários muitas vezes não tomam conta do paciente, os deixam livres para agirem dentro daquele espaço limitado chamado enfermaria. Essas enfermarias e o sistema de progressão, ou regressão, dentro delas toma boa parte das linhas, pois é um sistema meritocrático, lá dentro como aqui fora, e bastante complexo. Os sistemas de favores, de trabalhos realizados por pacientes, de alta e de retorno. Lendo o livro você começa a se sentir meio louco também, ou imagina que eles nem são tão loucos assim.

As prisões propriamente ditas são mais baseadas em interpretações e citação de pesquisas de colegas de profissão, pois Goffman é sociólogo, pelo que pude entender e utiliza alguns dos conceitos e descrições de seus pares. O sistema monetário dos presos, sejam eles de guerra, sejam eles fruto do ambiente urbano/rural, é o mesmo do utilizado nos manicômios: o cigarro. Por alguns filmes que assisti, e conversas com ex-presidários, isso não mudou em cem por cento, existe uma forma de escambo dentro dos presídios. O trabalho dentro da cadeia como forma de progressão da pena e atestado de recuperação funciona de forma semelhante ao dos hospícios, porém com as ressalvas dos tipos de trabalhos realizados e o grau de liberdade para se realizar essas tarefas. O preso carcereiro assim como o insano com as chaves da enfermaria é realidade nas instituições que os mantêm cativos.
Os conventos são a parte menos abordada dentro do livro por se tratar, na maior parte das vezes, uma instituição onde a internação é voluntária, por algum sentido de vocação ou chamado divino. Acredito que Goffman colocou os conventos por também se tratarem de instituições totais assim como as outras duas citadas nos parágrafos anteriores. O grau de escambo e desejo de ter “alta” quase não existe nesse tipo tratado aqui nesta parte do texto. Porque? Acredito a resposta ser o fato das pessoas ali possuírem um sentido especial em suas vidas, nisso claro tomando a fé delas como referência, porque eu não acredito em sentido especial para nada, a gente nasce e morre depois de um tempo, o intervalo entre nascer e morrer é obrigação nossa inventar o que fazer, não há missão nem nada de especial nisso. Somos máquinas de fazer mijo e merda.

Percebi agora uma coisa: não expliquei o que danado são instituições totais. Muito bem, parte didática do texto. Essas instituições são locais onde as pessoas desenvolvem todas as suas atividades, sejam os lazeres, as obrigações, ou quaisquer outras coisas capazes de passar por sua cabeça. Esses lugares são responsáveis por reintegrar o indivíduo à sociedade “curado” do mal responsável por interná-lo. O dormir e o acordar normalmente são regulados por horários, o comer, o vestir, o falar, tudo, tudo mesmo, pior que uma ditadura. Todas as regras são criadas para readaptar o sujeito, o problema é a consequente criação de formas de resistência ao sistema imposto. Pessoas não são tão simples assim de mudarem e obedecerem. Portanto as instituições totais nunca dão conta de todo o problema para o qual foi criada. Sempre há falhas.


Ao final disso tudo minha cabeça percebeu melhor algumas formas de prisão voluntariamente criadas por nós. Somos muito complexos e as vezes perdemos tempo com besteira, com protocolos inúteis, meias palavras, meios pensamentos, metades de vidas e o grande problema disso é a nossa liberdade para decidirmos agir como desejamos e foda-se quem achar ruim. Talvez o grande problema seja esse, a falta de respeito com as opções de vidas alheias. Normalmente não aceitamos, acolhemos, as pessoas que escolheram viver diferente de nós e isso causa um problema imenso pois a maior parte do mundo não vive como vivemos. Cada ser humano pertence a uma parcela pequena da população mundial e tem formas culturais e de vivência muito, mas muito particulares mesmo!

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