terça-feira, 25 de novembro de 2014

O boi de Maurício

  Cambaleante como sempre, Augusto, um sujeito alto e preguiçosamente sonolento, abriu a porta de sua casa. Olhou para a rua ainda escura, agradeceu aos orixás por ter chegado em casa novamente. Agradecia a cada madrugada que voltava com todas as suas posses nos bolsos.
     Largou a mochila sobre o tapete da sala e esfomeado partiu para a cozinha. Mataria um boi para comer. Depois de muito procurar, tudo o que encontrou foram apenas três bolachas soltas no fundo do armário. Pegou-as, sentou ao chão e amargou um banquete que não teve.
   Não tardou a devorá-las, uma por vez como se fossem preciosidades enviadas do céu. Enquanto andava pela casa e mastigava a primeira das três imaginava estar com um frango inteiro na boca, assado, suculento, deixando aquele óleo gorduroso encharcar a boca. Fechou os olhos para melhor visualizar. Em meio ao seu devaneio ouviu um mugido vindo do quintal de sua casa. Abriu os olhos fitando a porta da cozinha que dava para os fundos. Mera impressão.
   Demorou um pouco ainda olhando, mas nada de anormal ocorreu. Estava faminto mesmo. Deixou pra lá aquela vertigem momentânea e jogou-se sobre a segunda bolacha. Dessa vez estava comendo uma lasanha de proporções míticas, recheada dos mais diversos molhos e queijos. Exalava um cheiro forte de saciedade, aguçando todo o seu poder sensitivo. Fazia a fome parecer uma... Muuuuuuu – um segundo, e mais forte, mugido soou. A neblina dos sonhos abandonou a cabeça do jovem atordoado.
   Dentro do escuro seus olhos espantados fitaram a porta. Havia medo e expectativa. Olhou para a terceira bolacha tentando acreditar que ela não tinha nada de mofada ou de quimicamente diferente. Será que tinham colocado alguma coisa nela? Questionou se deveria comê-la de imediato ou se iria ao apertado quintal verificar como um bovino qualquer teria conseguido chegar ali, bem no alto do morro.   

   Curioso, a passos lentos atingiu a porta e foi-lhe derrubada a dúvida. Que seus santos o protegessem daquilo que estava vendo agora. Lá estava o antigo e medonho, o encantado e mítico Boi Voador! Suas asas negras e seu couro grosso enfeitavam o minúsculo local. Amarrado a uma estaca o animal o fitava, mexia a boca ironicamente, comia o capim da ilusão. Augusto mal sabia o que fazer. Um sorriso tomou lugar em seu rosto ao escorrer a saliva pelo canto de sua boca. A imagem de um suculento bife tomou-lhe a imaginação. Lampejou o pensamento:

- Onde guardei minha marreta e meu facão?

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